sábado, 23 de fevereiro de 2008

De Porcelana

Passava todos os dias, quando voltava da escola, pela frente de uma loja de porcelanas. Duas grandes vitrinas chamavam-me a apreciar o que nelas estava exposto. Era jovem ainda e muito amolado pelos meus colegas de classe por gostar dessas coisas sutis demais para um garoto de minha idade e influências.
Depois da aula, ficava esperando os outros alunos irem embora para depois ir andando com calma até chegar na frente da loja e sentar-me na calçada ficando horas a fio degustando a delicadeza que meus olhos não deixavam passar despercebida.
Certo dia, ao invés de olhar os pratos, acabei enxergando uma linda boneca ao fundo da loja; pele branca, olhos castanhos, bochechas rosadas, cabelos claros; quase brancos, longos e encaracolados. Estava trajada com um gracioso vestido xadrez. Nunca algo assim havia tocado meu coração com tamanha intensidade. Lembrava-me de tê-la visto já outras vezes, mas naquele dia estava excepcionalmente marcante. Quis tomar coragem para vê-la mais de perto. Porém, era humilde demais para algo tão esplendoroso. Uma boneca como aquela não merecia apenas minha simples e talvez recusável companhia. No entanto, ela parecia sorrir para mim. Minhas bochechas chegaram a avermelhar.
Sempre que passava por lá, ela estava sobre uma cadeira de balanço e com agulhas de tricô nas mãos, mas sempre com um vestido diferente. Talvez ela até nem estivesse à venda. Como poderia uma boneca tão amável estar naquela loja há meses sem ninguém ter perguntado o seu preço? Talvez porque, mesmo sendo mui bonita, ela estivesse empoeirada. Nem sempre a senhora que tomava conta da loja levava um lenço para limpar-lhe o rosto. A rua da loja era de chão batido.
Não contei sobre ela para ninguém. Senão, algum outro garoto poderia querer-lhe. Afinal, deixava as meninas do colégio no chinelo.
Resolvi economizar para comprar uma roupa mais bonita e - quem sabe? - assim, fazer-me mais digno a fim de entrar na loja e saber o preço da meninota. Entrei e fui em direção a ela:
- Por quanto posso te comprar?
- Com dinheiro, não pode - e sorriu.
Em breve, tentaria outra vez. Minha aparência ainda não era satisfatória. Na próxima, iria de chapéu para parecer mais velho:
- E agora, posso te comprar?
- Ainda não.
Vai ver, ela prefere que eu seja simples:
- E agora, posso?
- Você tem como fazê-lo?
- Não.
- Então, roube-me. Já estou tempo demais aqui. - e sorriu.
Sabia que era errado. Mas ela me pediu. E sorriu para mim. Não pude me conter, meus olhos brilhavam. Fitei-a e a roubei; mas não por inteiro. Roubei apenas o seu olhar.

Ana Carolina Gilgen

3 comentários:

Moika disse...

Gostei dos textos,e o blog esta bonito!!!Parabéns!!!


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http://blogdomoika.blogspot.com/

Bernard Freire disse...

Eras legal o texto!
De tanto insistir, e não conseguia.
Decidiu então roubar, desta vez conseguiu!

Blz!
ta comentado!

de uma passada la no meu!

Anônimo disse...

Tu escrves divinamente bem, parabéns!
Vi teu blog lá no orkut, comu Blogger.
Voltarei outras vezes, mas vou querer chocolate quente tá!? ;)
Bjinhos e feliz dia internacional das mulheres.
Bye=*