quarta-feira, 12 de março de 2008

Scarpin Vermelho

Apenas uma facada, e certeira, exatamente na jugular. Furei-lhe os olhos também, com um scarpin vermelho, para completar o serviço. Creio que não foi o bastante para o tamanho da minha fúria. Deveria tê-lo congelado e depois quebrado em pedacinhos e usado como adubo no meu pomar de abóboras.
Depois que ele me traiu, quando o peguei no ato, no sofá azul-bebê da sala, decidi que apenas fecharia a porta calmamente e diria para mim mesma que faria ele sofrer tanto que desejaria não ter comprado aquele sofá.
Então, quando três dias depois ele estava no trabalho, peguei seu carro e o bati num muro qualquer, ficou tão amassado que mais parecia um polígono de metal. Sumi com todas as suas roupas, até meias e cuecas. Tirei os móveis da casa e os deixei na casa de minha mãe. Enrolei-a, dizendo que tínhamos comprado nossa casa e iríamos morar juntos. Portanto, os móveis ficariam na casa dela provisoriamente.
A única coisa que sobrou, além da pia do banheiro... ainda na sala e no mesmo lugar, foi o sofá azul-bebê em que meu ex me flagrou nas mesmas circunstâncias que as dele, com o vendedor da Killer's, a loja de sapatos em que comprei o scarpin vermelho. Pasmo, meu ex ficou parado à porta olhando a cena, apenas me despedi do vendedor, que aliás nem sabia o nome, levantei-me, peguei o scarpin e meti nos olhos do traidor parado à porta. O golpe foi tão rápido que ele não pôde sequer imaginar. Logo, peguei a faca de pão e enfiei no seu pescoço, cortando sua jugular.
Um crime tão bem planejado, obviamente terminaria em fuga. Não há testemunhas, mas há suspeitos. E aqui estou eu escondida numa cabana qualquer no meio do mato. Sem contato com a família, com ninguém. Lamentando meu arrependimento, convivendo com alucinações e sonhando com o scarpin vermelho furando olhos por aí.
Eu sinto a dor por ele, agora percebo o quanto fui ridícula, pois meu motivos foram mínimos para tal feito. Penso o que farei quando me descobrirem, minha mente não me deixa em paz, barulhos me perturbam... Bastava apenas ter pago na mesma moeda, mas não, sempre fui assim... deixo as coisas piores, acabei com a vida dele, acabei com seus olhos e com sua vida, literalmente. Nem houve tempo para ele sentir a mesma sensação que eu ao se ver traído, já em seguida sentiu a dor da morte.
Nunca estive tão confusa, a traição nos leva a loucuras, se eu estivesse com a cabeça no lugar, nunca teria feito isso, essa não sou eu... a partir daquele dia nunca mais soube se essa sou eu de verdade.
Enquanto isso, vou mofar numa cabana, ainda sentindo o cheiro das lágrimas e do sangue de seus olhos no salto quinze do meu scarpin vermelho.

Ana Carolina Gilgen

2 comentários:

Eduardo, Cassio disse...

haha, certa vez escrevi um conto nonsense onde uma mulher matava um mendigo pisando nos miolos dele com o salto do sapato; só que não era um scarpin, acho. naquela época não sabia o que era scarpin.

semi-visceras, gostei :)

wylly wonka disse...

"Enquanto isso, vou mofar numa cabana, ainda sentindo o cheiro das lágrimas e do sangue de seus olhos no salto quinze do meu scarpin vermelho."


finalizou em grande estilo, adorei!!!

me lembrou tarantino=D